Durante os 8 anos em que conduzi pesquisa etnográfica no Japão pude acompanhar de perto como se dá a educação das crianças brasileiras no país. Existem escolas brasileiras e escolas japonesas, a escolha por uma ou por outra está diretamente ligada às expectativas da família em relação ao futuro.
Famílias que imigram com o objetivo de passar poucos anos no Japão, juntar dinheiro e voltar rápido para o Brasil normalmente colocam seus filhos em escolas particulares brasileiras, pois acreditam que as crianças precisam estar aptas a se adaptar ao sistema educacional brasileiro já que sua permanência no Japão será curta. No entanto, raramente essas famílias conseguem economizar o suficiente para retornar em um curto período para seu país de origem e seus filhos(as) vivem no Japão, mas com um contato mínimo com a cultura local, pois estudam em escolas brasileiras, aprendem muito pouco do idioma japonês, comem comida brasileira em suas casas e têm relação estritamente com brasileiros.
Essas famílias vivem em uma espécie de limbo em que mantém todos seus costumes brasileiros, mas vivem em outra cultura. A comunidade transnacional brasileira contribui neste sentido, uma vez que está bem consolidada com todos os serviços e produtos que os imigrantes estavam acostumados no Brasil. Existem supermercados brasileiros, lojas brasileiras de roupa, sapatos e acessórios, agências brasileiras de turismo, padarias, restaurantes, lanchonetes brasileiras, cabeleireiros, revistas, emissoras de tv, etc.
As crianças, que a princípio, iriam passar pouco tempo no Japão acabam crescendo no país. A falta de integração dessas famílias na sociedade anfitriã faz com que seus filhos não consigam trabalhos diferentes dos seus pais, ou seja, o trabalho rejeitado pelos japoneses, o que resulta na perpetuação do ciclo do imigrante brasileiro(a) como mão de obra desqualificada no Japão.
As famílias brasileiras que optam por colocar suas crianças em escolas públicas japonesas têm uma experiência diferente. A adaptação delas no começo não é fácil já que não dominam o idioma, nem a cultura local, no entanto, elas têm a oportunidade de aprender durante o convívio com as crianças japonesas e desenvolvem ferramentas culturais para se integrarem na sociedade anfitriã.
Essas crianças que frequentam escolas japonesas geralmente precisam ocupar papéis dentro de suas famílias para os quais ainda não estão psiquicamente maduras, como ser intérprete em órgãos públicos quando os pais precisam fazer algum tipo de documento ou quando precisam ir ao médico, por exemplo.
Observei também casos de crianças brasileiras que estudam em escolas japonesas que entendem português, mas falam muito pouco, pois passam mais tempo na escola do que na companhia dos pais que trabalham muito e chegam em casa cansados sem energia para brincar com os filhos.
Embora essas crianças, que estudam em escolas japonesas, estejam mais preparadas para quebrar o ciclo de perpetuação dos imigrantes como pertencentes a uma classe operária, elas não desenvolvem as ferramentas culturais necessárias para viver no seu país natal e por mais que decidam ficar no Japão para sempre dificilmente terão os mesmos direitos de um cidadão japonês.
Partindo do caso japonês, concluo que o melhor dos mundos seria uma educação em que as crianças brasileiras que moram no exterior pudessem aprender além das matérias curriculares básicas, o idioma local e o português e que tivessem a oportunidade de desenvolver ferramentas culturais tanto do país de origem quanto do país em que vivem. No entanto, para tal é necessária uma política pública educacional inclusiva nos países anfitriões, que respeite as peculiaridades das crianças imigrantes e também um esforço dos pais para que a educação de seus filhos e filhas seja de fato intercultural. Desta forma, essas crianças crescerão com habilidades culturais para se adaptarem tanto no Brasil quanto nos países que os receberam.
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